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Inflação e PIB Acentuam Tendências em meio a Pandemia
(Renato Antonio Henz – Economista da Gerência de Inteligência, Análise Econômica e
Projetos Especiais)
Embora a economia do país, e em particular o setor agropecuário, se encontre em
situação inédita, em decorrência dos efeitos da pandemia e das medidas adotadas
pelas autoridades em diferentes instâncias, algumas tendências vão se consolidando,
ainda que com dificuldade para serem, quantitativamente, estimadas. Uma destas que
se confirma são as previsões do PIB que, segundo o Relatório Focus, há quatro
semanas ainda se previa uma queda de 3,76%, no entanto, no último relatório os
agentes do mercado já esperam uma queda de 6,25%. Em se tratando da inflação, a
previsão era de queda de 1,97% há quatro semanas, passando agora para 1,55%,
conforme relatório Focus de 29 de maio. Todavia, esta queda da inflação nos meses
mais recentes tem tido comportamentos bastante diferenciados entre os principais
grupos que compõem o IPCA.
A inflação no mês de abril, medida pelo IPCA, que foi de -0,35%, apresentou um
comportamento antagônico nos dois grupos de maior peso no índice, ou seja, no
grupo “alimentação e bebidas” e no grupo “transportes”. Aliás, este comportamento no
índice de abril foi magnificado em relação ao que já havia sido observado em março,
isto é, aumentos no grupo “alimentação e bebidas” se contrapondo a quedas no grupo
“transportes”. O grupo “alimentação e bebidas”, que em março registrou uma alta de
1,13%, com impacto no índice de 0,22 pontos percentuais, agora em abril já subiu
para 1,79%, com impacto de 0,35 pontos percentuais no IPCA. Já o grupo que
realmente definiu queda foi “transportes”, que após ter caído 0,90% em março, com
impacto de -0,18 pontos percentuais naquele mês, agora em abril caiu mais 2,66%,
com impacto de -0,54 pontos percentuais no índice.
No grupo “alimentação e bebidas” é interessante, ainda, salientar que o subgrupo
“alimentação no domicilio” teve alta ainda maior, de 2,24%, sendo que o índice para o
subgrupo “alimentação fora do domicilio” registrou uma alta de 0,76%. O
comportamento deste subgrupo foi impactado, sobremaneira, pelo item lanches
(+3,07%), já que o item refeições voltou a cair (0,13%). Salienta-se a dificuldade de
levantamento do item refeições, considerando que a maioria dos restaurantes do país
foi fechada, sendo até mesmo difícil separar lanches de entregas de restaurantes.
Voltando à alimentação em domicilio, que reflete de forma mais apropriada as
compras no mercado de produtos agrícolas, o destaque fica para a alta dos preços da
cebola (34,83%), da batata-inglesa (22,81%), feijão-carioca (17,29%), e leite longa
vida (9,59%). Por outro lado, na queda do grupo destacam-se as carnes (-2,01%),
ainda refletindo ajustes após as altas observadas no final do ano passado, mesmo que
mantendo a demanda do mercado externo sustentada.
Como visto acima, o destaque na pressão baixista do índice de abril foi o grupo
“transportes” (-2,66%), explicado, tal como em março, pela queda acentuada nos
preços internacionais do petróleo, com a cotação do barril tipo “Brent” atingindo valor
próximo a US$ 20,00 em abril. O choque só não foi maior devido à alta na cotação do
dólar, que atenuou a queda dos derivados do petróleo expressos em moeda nacional.
Ainda assim, a queda no subgrupo “combustíveis” foi de 9,59%. A redução dos preços
da gasolina foi de 9,31%, produto que individualmente explica -0,47 pontos
percentuais do índice geral que, apenas para ter a dimensão deste impacto, foi de –
0,35%. A redução dos preços da gasolina só não foi maior que a verificada no etanol (-
13,51%). Em menor proporção, mas também em queda, o óleo diesel (-6,09) e o gás
veicular (-0,79%), completam o quadro baixista do subgrupo combustíveis.
No que concerne a queda do preço do etanol, vale lembrar que as indústrias
processadoras de cana-de-açúcar que produzem etanol, sobretudo aquelas não
conversíveis para a produção de açúcar e, por enquanto em menor proporção as
indústrias produtoras de etanol a partir do milho, vêm sofrendo estes impactos nos
preços do produto, de forma até mesmo dramática, como têm sido apontados em
análises elaboradas por técnicos da Conab. A expectativa, no entanto, é de que esta
situação já tenha sido revertida em maio, uma vez que no citado mês os preços do
petróleo tiveram recuperação e hoje já se aproximam de US$ 40,00 o barril.
O segundo grupo com maior queda foi o de “artigos de residência” (-1,37%), e impacto
de -0,05 pontos percentuais no índice geral, explicado pelas quedas nos preços dos
itens mobiliários (-2,92%) e eletrodomésticos e equipamentos (-3,58%), certamente
devido às restrições ao funcionamento do comércio. De outra forma, também em meio
à pandemia e compras pela internet, os artigos de tv, som e informática registraram
alta de 0,72%.
Concluindo o tema inflação, deve-se ter em conta, a partir das previsões atuais de
inflação para o ano de 2020, que a mesma deve se situar muito abaixo do limite
inferior do intervalo da meta, que é de 2,50%. A expectativa do mercado é de que a
inflação de maio registre ainda uma queda de 0,40%, e somente em junho voltando
para valores positivos, ainda que próximos de zero, com previsão de uma alta de
0,04%. Somente em julho se espera uma inflação mais significativa, de 0,25%. Diante
deste cenário, muitos analistas preveem reduções adicionais da Selic, ainda que se
conclui que na situação atual a inflação já é considerada insensível a taxa de juros, ou
seja, a inflação não responde à política monetária. Portanto, a perspectiva é de que o
Copom, como previsto nestes casos, deve justificar perante o Conselho Monetário
Nacional-CMN porque a inflação se situou fora dos limites do intervalo. Dada a
situação inédita da economia, certamente não será difícil justificar o não cumprimento
dos limites da banda da meta de inflação para este ano.
Em se tratando do PIB para o ano 2020, cujas previsões semanais no decorrer da
pandemia vêm sendo sucessivamente reduzidas a cada nova pesquisa entre os
agentes econômicos, chegou-se agora a uma previsão de queda de 6,25%, ou seja, o
cenário é ainda nebuloso. Em relação à evolução real do PIB, o IBGE divulgou as
estimativas do comportamento verificado no primeiro trimestre do ano, que inclui o
mês de março, período que já capta o início dos efeitos da pandemia e das medidas
de distanciamento social impostas pelas autoridades que passaram a restringir
atividades econômicas consideradas não essenciais. A queda estimada pelo IBGE
neste primeiro trimestre, em relação ao trimestral anterior, foi de 1,5%, não havendo
surpresas quanto ao desempenho dos setores que compõem o PIB.
Como esperado, o setor de serviços foi o que registrou a maior queda, de 1,6%,
seguido de perto pela indústria com queda de 1,4%. Na contramão, também como
esperado, o setor agrícola foi o único que cresceu no primeiro trimestre, com alta de
0,6%. Espera-se o aprofundamento destas tendências neste segundo trimestre, que
deverá ser o auge da crise sanitária e o aprofundamento da econômica. A queda no
PIB do setor de serviços é relevante, pois representa cerca de 72% do PIB. Segundo
análise do IBGE “Aconteceu no Brasil o mesmo que ocorreu em outros países
afetados pela pandemia, que foi o recuo nos serviços direcionados às famílias devido
ao fechamento dos estabelecimentos. Bens duráveis, veículos, vestuário, salões de
beleza, academia, alojamento e alimentação, sofreram bastante com o isolamento
social”.
Contudo, como mencionado em textos anteriores, e vem sendo mostrado nas análises
realizadas pela Conab, o setor da economia, que de uma forma geral tem sido menos
afetado, é o da agropecuária. Devido as suas próprias características de
funcionamento, esta situação é confirmada pelos números do IBGE. Embora tal
evolução positiva, verificada na agropecuária não ajude muito nos números do PIB,
uma vez que a agropecuária contribui com apenas 7,8% do valor da produção, em
contraste com os 20% do setor industrial e os cerca de 72% do setor de serviços, a
agropecuária é incluída no setor primário, e, portanto, estabelece em grande medida a
base produtiva para os demais setores. Em outras palavras, é sobre a produção
agropecuária que se constrói toda a estrutura produtiva de uma economia e, neste
sentido, o recorde de safra registrado neste ano deve contribuir para minimizar os
efeitos negativos sofridos pelos demais setores, e estabelecer as bases para uma
retomada sustentável.
Ser menos afetado, no entanto, não significa que o setor passe incólume aos efeitos
da pandemia e de suas consequências. Além de alterar o perfil do consumo e os
canais de distribuição, com fechamento de restaurantes e outras formas de
fornecimento de alimentação, outros problemas, estes mais graves, estão ocorrendo
em atividades específicas do setor agrícola. Na área de produtos da
sociobiodiversidade, por exemplo, sérios problemas estão ocorrendo no fluxo de
comercialização, com cancelamento de contratos e suspensão de compras que estão
comprometendo a viabilidade deste tipo de atividade, justamente onde se verifica uma
vulnerabilidade maior dos produtores. Segundo o acompanhamento realizado pela
Conab, as restrições encontradas no mercado de produtos da sociobiodiversidade
devem ser sentidas por mais de 4 mil pequenos produtores, que correm até mesmo o
risco de terem suas atividades suspensas.
Por último, nas discussões sobre o tema do momento, a saúde da população, vale
sempre lembrar a responsabilidade dos produtores agrícolas e de todos aqueles que
apoiam esta atividade, tal como da Conab, na estreita relação entre a alimentação e a
saúde. Hipócrates, considerado o pai da medicina, já recomendava há mais de 2400
anos: “Que seu remédio seja seu alimento, e que seu alimento seja seu remédio”.
A sabedoria desta frase é cada vez mais atual uma vez que a ciência desde então só
vem comprovando a estreita relação entre o hábito alimentar e a diminuição do risco
de doenças crônicas, e até mesmo da sua importância no tratamento das
enfermidades. Finalmente, citando esta sábia afirmação como mensagem final, pode-
se entender a importância daquelas atividades que estão comprometidas com o
fornecimento deste “remédio”, que é a alimentação, em quantidade, qualidade e em
condições acessíveis a toda a população.
Fonte: CONAB (Companhia Nacional de Abastecimento)